Chapéu de Sol – Coletivo de Arte e Cultura

UM SER QUE VAGA

Lisa

Gente que anda sem rumo
e vira paisagem
na urbanomegacidade.
O som das buzinas
já faz duvidar da fome.
Os gritos de pare, do rush.
Poderia haver algo assim?
ELE quer o bem e escreve certo.
Incontáveis horas de surto,
na dúvida de estar ou viver
por séculos sem, finalmente, morrer.
A fome já não importa,
não há mais por que comer.
Se alimentaria de algodão-doce
e, um dia, simplesmente nuvens.
Agora o entardecer
e o céu parece lilás,
e o ser absoluta cópia
do que O rodeia.
Talvez Alguém o alimente;
afinal, caminha há tanto tempo,
que nem sabe mais se aprecia
a paisagem ou uma câmara de gás.
Madrugada na ponte,
os pensamentos ainda estavam lá,
pequenos pontos brilhantes
e sal em sua boca.
A fome passou.
Ficou o vazio.
Sem mais nuvens,
não mais poderia comê-las.
O tempo parou na luz
amarela, indigente.
Avenida Vinte e Três,
muitos carros e algo além,
que distraiu a realidade
e o aproximou do fim, enfim.
Uma voz soa cansada
e distante. Voz de quem já se foi,
como cada segundo de vida,
enquanto a vida se alimenta
de seres assim.
Como registrar esse momento?
Andarilha da casa de letras
que concede seu ventre
no leito de morte,
coberta e indigente,
procurada apenas pelos ratos
que dormem ao seu lado,
após comerem algodão-doce.
Finalmente o vazio.
Não há mais cansaço,
nem fome,
apenas a paz
e o silêncio
em um banco
da Praça da Sé.

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